Bem Vindo

terça-feira, 27 de junho de 2017

Manifesto contra SUBSTITUTIVO AO PROJETO DE LEI N. 3.729/2004 do relator Deputado Mauro Pereira




A Sociedade de Arqueologia Brasileira – SAB vem por meio desta consternar sua extrema preocupação em relação ao Substitutivo ao PL 3.729/2004 de autoria do Sr. Deputado Mauro Pereira, entregue à Comissão de Finanças e Tributação em 27 de abril de 2017.
Em suma, o substitutivo proposto acaba com o licenciamento arqueológico preventivo, contrariando a Constituição Federal de 1988 que, em seus artigos 216 e 225, considera o patrimonio arqueológico pertencente à Uniao, garantido a sua proteção pelo Estado. 
No Substitutivo ao PL 3.729/2004, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, “Órgão do Ministério da Cultura que tem a missão de preservar o patrimônio cultural brasileiro”’, incluindo o patrimônio arqueológico, não é sequer citado.

Dentre os problemas identificados, destacam-se:
 - Nos itens I e II do artigo 7, a redação do PL permitirá que a implantação de empreendimentos relacionados às atividades agrícolas e de silvicultura possam ser estabelecidos sem nenhum estudo prévio; o mesmo ocorre nos itens IV e V, os quais desobrigam o empreendedor a realizar estudos em projetos de dragagens, captação e distribuição de água, colocando em claro risco o patrimônio arqueológico;

 - No item III, artigo 28, da seção 6, o texto aponta que autoridades responsáveis pelo patrimônio devem ser ouvidas quando bens acautelados existirem na ADA. Mas se o IPHAN não está envolvido desde o início do processo, como garantir que serão realizados estudos que permitam a identificação desses bens? Vale lembrar que a maioria dos bens arqueológicos não está nem registrada e tão pouco visível, ou pode ser identificada por um leigo.

 A SAB reconhece que os mecanismos de licenciamento podem e devem ser aprimorados, porém, as medidas contidas no texto Substitutivo do PL 3.729/2004 não contribuem para tal aprimoramento. Ao contrário, fragilizam o processo de licenciamento, colocando em risco a proteção e a preservação do patrimônio arqueológico brasileiro, bem único e não renovável, de propriedade e interesse de toda a sociedade. Seu estudo permite conhecer, por meio dos objetos deixados por nossos antepassados (que formam os sítios arqueológicos)  as diferentes culturas que compõe a sociedade brasileira.  
Dentre inúmeros outros casos, exemplificamos, a seguir, sítios de alta relevância encontrados em diferentes tipos de empreendimentos que só foram estudados graças à legislação vigente de licenciamento ambiental/arqueológico e à participação do IPHAN no processo de licenciamento:
 Cais do Valongo – Rio de Janeiro/RJ – revitalização do Centro do Rio de Janeiro - Sítio na lista indicativa da UNESCO para se tornar patrimônio da humanidade
Gruta do Gavião – Carajás/PA – área de mineração
Sítio Lítico Morumbi – São Paulo/SP – área de construção civil
Sítio Portocel – Aracruz/ES – área de silvicultura
Geoglifos  -  Acre – linha de transmissão
Sítio Pinheiros II – São Paulo/SP – área de construção civil
Sítio arqueológico Caetetuba – São Manuel/SP – sítio de 12 mil anos - área de expansão de lavoura
Porto de Santos – SP – dragagem do leito do porto
Datação mais antiga para sambaquis no Espirito Santo – área de loteamento
Arraial de São Francisco -  Mato Grosso – área de mineração
A exclusão do IPHAN no processo de licenciamento implícita no substitutivo proposto, a despeito do grande avanço proporcionado pela IN 001/2015 e ao grande incremento de seu quadro técnico, é inadmissível e coloca em risco o patrimônio da União, conflitando com a legislação de proteção vigente, além da própria Constituição do Brasil. A liberação de categorias de empreendimentos, como os agrícolas e a silvicultura, entre outros, sem considerar suas dimensões e localização, é ignorar o potencial impacto negativo que essas atividades exercem sobre os sítios arqueológicos. Os quais, sem adoção das devidas medidas de mitigação e compensação, podem levar à destruição de inúmeros sítios arqueológicos e, consequentemente, à impossibilidade de produzirmos narrativas sobre o passado da sociedade brasileira.
A menção à necessidade de comunicação em caso de descobertas fortuitas de vestígios arqueológicos na ADA dos empreendimentos demonstra a total ignorância a respeito da necessidade de pesquisas prévias para identificação e proteção desse patrimônio. Não se pode delegar ao acaso a proteção da história e cultura de uma nação.
 Assim sendo, a SAB considera o Substitutivo ao PL 3.729/2004 uma iminente destruição do patrimônio arqueológico brasileiro e reitera a necessidade do IPHAN ser ouvido nos ritos de licenciamento, de acordo com o exposto na IN 001/2015.
A Arqueologia é a ciência social que estuda, por excelência, os objetos deixados por inúmeras sociedades que habitaram e habitam o território nacional, visando à compreensão de suas transformações ao longo de milhares de anos. A Sociedade de Arqueologia Brasileira (SAB) é uma associação científica e sem fins lucrativos, que congrega arqueólogas(os) dedicados ao ensino, à pesquisa e à prática da Arqueologia, visando à promoção, ao conhecimento e à divulgação da arqueologia e do patrimônio arqueológico brasileiro. Fundada em 1980, vem lutando ao longo desses anos pela proteção do patrimônio arqueológico brasileiro e pelos direitos de comunidades tradicionais do Brasil.

   
Prof. Dr. Flávio Calippo
Presidente da Sociedade de Arqueologia Brasileira


SAB - Sociedade de Arqueologia Brasileira
http://www.sabnet.com.br/

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