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segunda-feira, 26 de setembro de 2016

TELEOPERADORES: ADOECIMENTO MASSIVO E A PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO - RENATA QUEIROZ DUTRA - FACULDADE DE DIREITO(UNB)


 
Eles ganham um salário mínimo, trabalham de forma terceirizada, sob pressão constante para cumprimento de metas consideradas impossíveis, e por tabela, servem de escudo entre empresas dos mais variados tipos de comércio, prestação de serviços e produtos e as respectivas clientelas. De acordo com o Sindicato dos Telefônicos do RS (Sinttel/RS), atualmente,  constituem mais de 2 milhões de trabalhadores legais e ilegais de telecentros pelo Brasil, mais conhecidos como call centers, atuando como braço terceirizado das grandes empresas, fazendo o telemarketing, seja Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) ou na área de vendas.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB) no primeiro semestre deste ano, apresenta um estudo inédito que será publicado até agosto. Elaborado por Renata Queiroz Dutra, mestre em Direito do Trabalho, defende que a precarização no setor de call center resulta em adoecimento, porém, as decisões do Tribunal Superior do Trabalho (TST), apesar de muitas vezes favoráveis aos trabalhadores, dissociam causa e consequência.

 “Os trabalhadores de call center têm passado por um processo de precarização gradual e que tem resultado em adoecimento, e eu procurei analisar alguns acórdãos do Tribunal Superior do Trabalho, que vão de 2005 a 2013, para avaliar como o poder Judiciário tem compreendido a relação de causa e efeito entre precarização e adoecimento. Então, analisei tanto os pedidos de trabalhadores que se referiam aos processos de precarização, contratos terceirizados, controle de uso de banheiros, assédio moral e cobrança de metas”, explica. Segundo ela, quando adoece, o trabalhador reclama uma indenização na Justiça do Trabalho, porém, há um “dado gritante na pesquisa”: ainda que a estrutura judiciária tenha oferecido alguma resposta nos casos de adoecimento, condena as empresas, mas com valores de indenização que ficam muito aquém do que seria minimamente necessário para compensar os danos sistemáticos de adoecimento num tipo de trabalho que tem atingido maciçamente os trabalhadores.

“Mas o mais grave de tudo é o poder Judiciário não estabelecer esta conexão entre o adoecimento massivo e a precarização do trabalho como causadora. Eu tive a oportunidade de ver muitos casos em que a Justiça do Trabalho entendia que a terceirização era lícita, que o controle dos banheiros era algo tolerável, que não havia excesso na cobrança de metas. No entanto, no que se refere ao adoecimento, penalizava o empregador. Ou seja, separa a causa do efeito, quebrando o nexo”. Na opinião da pesquisadora, isso reprime a empresa no que se refere ao adoecimento, mas não tem uma ação preventiva no que se refere às causas: conduta e modelo de gestão do empregador que precarizam e que produzem dentre outros fatores, o adoecimento.

Outra conclusão grave do estudo é o descumprimento da NR 17, e que o Judiciário tem dialogado pouco com a norma. Muitas das questões que são discutidas nos processos dos operadores de call Center vêm amparadas em violações da NR, em situações que já estão previstas na norma, mas o Judiciário tem tratado todas essas situações sem nem sequer se reportar ao texto da NR. “É uma das poucas normas que mais do que proteger a saúde, protege a integridade e a dignidade do trabalhador. Esta norma tem sido ignorada. Existe uma diferenciação entre os tribunais regionais e o TST, principalmente no que se refere ao reconhecimento da NR, por conta de uma restrição técnica. Os TRTs têm maior liberdade de entender os casos, quanto o TST só recebe esses fatos para enquadrá-los juridicamente. O que resulta disso é que ao invés de se perceber que é um problema coletivo, acaba sendo individualizado”. Renata destaca, porém, o marco firmado pelo TST em 2012, que reconhece a terceirização na atividade de call center como ilícita, gerando jurisprudência no reconhecimento do vínculo empregatício diretamente com a empresa concessionária.

“Isso significa um grande avanço no patamar de direitos desses trabalhadores, embora não estabeleça o vínculo com o adoecimento, já houve condenações exemplares no que se refere à terceirização, mas ainda há muito o que avançar”, analisa. Atualmente, conforme decisão do TST, esse tipo de terceirização praticada por essas empresas é ilícita. A subcontratação desses trabalhadores por grandes empresas para prestar serviços para terceiros ocorre de forma ilícita. E quando eles reclamam o vínculo empregatício na Justiça do Trabalho, o mesmo é atribuído diretamente à tomadora de serviços, no caso empresas como Net, Tim, Vivo, Telemar, entre outras, que terceirizam esse tipo de atividade. “O que existe no ordenamento jurídico hoje é que a terceirização de atividade-meio é tolerada e que a de atividade-fim é proibida, pois existe, no segundo caso, uma empresa interposta entre o tomador de serviço e o trabalhador somente para a intermediação de mão de obra e isso é uma forma de tratar o trabalho como mercadoria, o que não é admitido pelo nosso ordenamento jurídico, nem pela Constituição nem pela OIT”.

No caso, ela esclarece que a atividade de telefonia é a relação da empresa com o cliente e que isso faz parte da atividade principal. “O assunto agora está no STF, mas o que se espera é que não haja retrocesso nesse aspecto, pois pode gerar mais precariedade do que a existente”, projeta.

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