Professor do curso de especialização em museologia da USP, Marcelo Mattos Araújo dirige uma das principais instituições de arte do País - a Pinacoteca do Estado de São Paulo. De passagem pelo Ceará, onde integrou a comissão de premiação da XVI Unifor Plástica, ele falou ao Caderno 3 sobre a arte cearense e o papel social de instituições artísticas
Qual a importância para o País de uma Pinacoteca como a de São Paulo?
A Pinacoteca é um museu que foi criado pelo Governo do Estado de São Paulo em 1905. Somos, portanto, uma instituição já centenária, com um acervo de mais de 9 mil obras, majoritariamente de artistas brasileiros ou de artistas estrangeiros que passaram a produzir no Brasil, porque viviam no País. E uma instituição que busca desenvolver um programa de exposições temporárias de uma abrangência muito grande, abarcando todos os momentos da história da arte, desde uma produção histórica até a produção contemporânea e um diálogo com a apresentação do acervo. A missão da Pinacoteca é a preservação, não só do seu acervo artístico mas também do acervo bibliográfico e arquivístico que hoje em dia também são bastante destacados, e buscar que a experiência que o visitante tenha na Pinacoteca com as obras de arte seja a mais consistente e estimulante possível. Para tanto, ela busca também desenvolver uma ação educativa que também se desenvolve através de vários programas muito consolidados, buscando não só trabalhar com alguns públicos específicos.
Aqui no Ceará, ainda não temos Pinacoteca. Seria possível fazer uma análise de que prejuízos isso pode trazer para uma cultura artística local?
Como não conheço a fundo a realidade do Ceará, é difícil fazer esta avaliação. O que eu sei é que existem instituições museológicas importantes no Estado, como o espaço da Unifor. Na cultura contemporânea, um papel muito importante que os museus podem desempenhar é o de contribuir para o desenvolvimento da alfabetização visual do público - lembrando que, na cultura contemporânea, a linguagem visual tem um papel chave. A gente pode, inclusive, entender como que esse papel social que os museus desempenham tem hoje em dia um status, uma especificidade muito grande, inclusive como elemento constitutivo do exercício da cidadania.
Uma das características da Pinacoteca de São Paulo é não ser restrita ao Estado. Ela procura ter um leque bem amplo das obras brasileiras. Como é que é feito esse garimpo, seja dos artistas mais antigos, mas também daqueles que estão em plena atividade?
Nós temos um programa de aquisição de obras, de expansão do acervo, que se desenvolve por meio de diferentes estratégias. Uma estratégia, claro, é o uso de verbas destinadas pela Secretaria da Cultura de São Paulo para esse objetivo. Elas são canalizadas, fundamentalmente, para aquisição de obras históricas, ou seja, trabalhos que nascem até a década de 60, 70. Nos últimos anos isso tem nos permitido a aquisição de obras importantes para o nosso acervo, de artistas que, ou não estavam presentes, ou não estavam devidamente representados. No ano passado, por exemplo, com as verbas desse fundo conseguimos comprar um conjunto de 40 gravuras de Goethe. E outra estratégia que nós adotamos é a busca de apoios, principalmente de empresas através da Lei Rouanet, também para aquisição de obras. E também, uma outra estratégia, através do apoio que nós temos recebido do Iguatemi, que tem origem aqui no Ceará, e do Banco Espírito Santo para aquisição de obras contemporâneas, durante a realização da SP Arte, que é uma feira de arte que ocorre em São Paulo no mês de maio.
Como são escolhidas as obras para aquisição?
Todas as aquisições seguem um procedimento básico. Começa com uma primeira indicação do nosso grupo de curadores; depois, é avaliada e analisada pelo nosso Conselho de Orientação Artística, que aprova essas propostas de aquisição de acordo com uma política pré-estabelecida que existe, que já mapeou o acervo, já indica, sejam as ausências, sejam áreas prioritárias para o nosso crescimento e fortalecimento. E, por fim, uma última aprovação também é necessária por parte da Secretaria de Estado da Cultura. Então, são todos esses procedimentos. É claro que como a Pinacoteca está localizada em São Paulo ela acaba tendo um certo olhar mais privilegiado para a produção em São Paulo, mas principalmente da produção contemporânea, que, hoje em dia, com o trânsito todo que existe entre os artistas, as exposições, a gente busca e tem conseguido uma representatividade grande da produção brasileira de uma certa maneira geral.
Nos últimos tempos, a Pinacoteca realizou exposições de Leonilson e de Sérvulo Esmeraldo. Como é a participação de cearenses no acervo da instituição?
Olha, estes são dois artistas superimportantes e representativos. A exposição do Sérvulo aconteceu no primeiro semestre do ano, e eu reputo como uma das iniciativas mais importantes que nós realizamos recentemente. O Sérvulo é um artista de primeira grandeza e é um desses pontos sem explicação da história da arte brasileira, como um artista da riqueza do Sérvulo ainda não recebeu o reconhecimento, a valorização que merece. Temos obras dos dois. Agora, por exemplo, um artista cearense que admiro muito, o Raimundo Cela, não está presente no nosso acervo. É uma dessas lacunas. Gostaria muito que, em algum momento, a gente pudesse preenchê-la.
Como é que se faz para um museu de arte se manter bem frequentado?
Olha, não acho que exista propriamente uma receita. É um trabalho. A museologia é uma disciplina científica. Portanto, ela é a disciplina que pode orientar e contribuir para os procedimentos técnicos necessários, mas o que eu acho que é fundamental como espírito museológico para a gente entender é que uma instituição museológica tem o seu sentido maior na relação que ela vai estabelecer com o público. Então, é nessa prestação de serviço para o público que o museu tem que buscar a sua vocação, o seu norte, a sua orientação pra poder se constituir uma instituição que tenha sentido e que portanto consiga estabelecer essa relação e fazer com que o público, na sua busca, inclusive, mais ampliada e diversificada possível, possa ser o elemento orientador das suas atividades.
MAIS INFORMAÇÕES
XVI Unifor Plástica - No Espaço Cultural Unifor (Av. Washington Soares, 1321). Aberto ao público até 22 de dezembro, de terça a sexta, das 8 às 20 horas. Sábados e domingos, das 10 às 18 horas. Estacionamento gratuito. Contatos: (85) 3477.3400 e
http://www.unifor.br/FÁBIO MARQUES
ESPECIAL PARA O CADERNO 3
Fonte de Pesquisa:
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1063033Foto: FolhaPress.